29 de jun. de 2011

Pois é

Ramiro Simch
@miroez

“Era um tempo bom, meu filho. As pessoas eram mais próximas, não tinha televisão” disse a vovó, ligando o aparelho para assistir o Video Show.

“Eu cozinhava com a minha mãe no fogão a lenha. Era um momento familiar, meu pai e meus irmãos sentavam à mesa, e todos conversávamos” lembrou a velha, retirando a lasanha pronta do micro-ondas.

“Meu pai comprava o jornal todo dia, minha mãe tinha as revistas dela. As pessoas liam mais, meu anjo” sentenciou, sentando-se ao notebook para ler seu blog favorito.

“Ah, banheiro é uma coisa que continua igual” completou a anciã, depois da cagada.


27 de jun. de 2011

Quem inventou o amor?

@pv_lopes


Um tema que pode render longas conversas, inúmeras teses, vários especialistas. De tudo há apenas uma certeza, não existe fórmula certa, receita pronta. O sentimento é ímpar, mutável, aconchegante.

Singelo, como cada momento pode ser. Avassalador, como algo verdadeiro deve acontecer.
Cada um ao seu modo, da sua maneira mais encantadora.

Oferece, como um exercício, a possibilidade de tentar entendê-lo.
Como nesta animação baseada em uma música do Legião Urbana.






Banda: Legião Urbana
Música: Antes das Seis
Álbum: Uma Outra Estação

23 de jun. de 2011

Lá no fim da rua

Ramiro Simch
@miroez

o sol nasceu em cima da rua Águia
do jeito que nasce há oitenta verões
redondo, laranja, sossegado, frio
assim a rua Águia enxergou seu sol.

e aquela senhora, tão aprazível
ali adiante, andando, quem é?
é a Dona Raíssa, ora, quem mais?
que mora aqui, toda a vida morou.

no passo pequeno (como que de formiga!)
a antiga chegou à entrada do lar
após caminhar, de ponta a ponta, a rua amiga.

mas veja, que susto! a porta arrombaram
as coisas roubaram, a vida sumiu
e Dona Raíssa? já era sua hora - os anjos levaram.



20 de jun. de 2011

Preciso de Envolvimento

@pv_lopes


Preciso de envolvimento. Chega de relacionamento morno. Indiferença devia ser crime punível de morte.
O mais ou menos causa náuseas. Desejo ficar longe das relações baseadas no mediano.

O mediano é aquele café passado vendido no bar, a super salada de chuchu. É o tudo bem no corredor, o entenderam durante uma aula.
Quero o telefone desligado abruptamente, a porta batida na cara, o choro e o tapa no rosto. O pedido de desculpas, o beijo de tirar o fôlego.

Chega de passar os dias. Quero realmente viver.

17 de jun. de 2011

Final Feliz

Ana Elizabeth S. de Azevedo
@anabebeth

Propensa à dor, ela segue
Com medo, não se aproxima
Sente, sabe que não deve
Seria sofrimento, como de rotina?

Algo diferente surge, porém
Sentimento leve, assim
Pensa, de fato, que pode ir além
Sem receio algum, enfim

Mergulha em um mar de tranquilidade
Deixa-se levar de olhos fechados
Nada mais importa, que tal felicidade

Quem ousaria pensar tal desfecho?
A menina que era triste, de repente,
Viu realizado por completo, seu desejo.

16 de jun. de 2011

Estaremos lhe trollando

Ramiro Simch
@miroez

“Boatardecentraldeatendimentokonijnemquepossoajudá-lo?”
“Boa tarde. Eu sou cliente da Konijn e tava olhando agora um folheto com as promoções disponíveis. Eu vi que existe uma promoção nova, Konect 300+, que se encaixa no meu plano. Queria ver se dá pra me cadastrar aí.”
“Seu nome, senhor?”
“É Rui Corção.”
“Um momento, senhor.”

É A CIGANA

“Senhor Rui?”
“Oi.”
“O senhor havia dito que deseja estar cadastrando-se na promoção Konect 300+, não é mesmo?”
“Sim.”
“Senhor, não é possível estar realizando o seu cadastro porque o senhor já é cliente Konijn.”
“Como assim?”
“A promoção Konect 300+ concede 300 minutos por semana para falar de Konijn para Konijn. Infelizmente ela só está disponível para novos usuários, senhor.”
“Peraí, não entendi. Quer dizer que eu não posso participar da promoção porque eu já sou cliente de vocês??”
“Exatamente, senhor.”
“Quem entra agora tem direito a falar de graça e quem é cliente fiel há nove anos não???”
“Senhor Rui, infelizmente a promoção Konect 300+ é exclusiva para os novos usuários. Usuários antigos não estão tendo direito a estes minutos.”
“Isso não tem lógica nenhuma. Uma pessoa que passa a vida inteira com a Konijn não tem os benefícios que quem vira cliente agora tem!”
“Um momento, senhor.”

SANDRA ROSA MADALENA

“Senhor Rui?”
“Oi.”
“Senhor, eu estive checando o sistema e infelizmente o senhor não está tendo direito à promoção Konect 300+. Mas dentro de poucos dias poderemos estar lhe enviando um coelho de pelúcia pela fidelidade que o senhor esteve demonstrando nestes anos, se houver interesse.”
“Não, faz o seguinte: cancela minha conta.”
“O senhor deseja cancelar sua conta, senhor?”
“Sim, cancela. Quero deixar de ser cliente da Konijn.”
“Um momento, senhor.”

É A MULHER COM QUEM EU

“Senhor Rui?”
“Oi.”
“Sua conta foi cancelada, senhor.”
“Ok,obrigado. Agora eu quero começar uma nova conta.”
“O senhor deseja começar uma nova conta, senhor?”
“Sim, se for possível.”
“Sem problemas, senhor.”
“E quero me cadastrar na promoção Konect 300+, por favor.”
“Sem problemas, senhor. Estaremos lhe cadastrando em breve, e o senhor terá acesso a todos os benefícios que só um Konijn tem.”

VIVO A SONHAR


13 de jun. de 2011

Estações

@pv_lopes

Faltam muitos dias para o verão. A sensação é de uma eternidade. A lembrança é continua. 
Na teoria, o inverno é ótimo. Ficar perto da lareira, tomar um chocolate quente. Prazeres envoltos pelo prazer das baixas temperaturas.

Concluo que em todos os aspectos o verão é melhor. Mais fácil para tomar banho, para vestir uma roupa, levantar da cama. As pessoas andam mais sorridentes no verão. O inverno é solitário, carrancudo. Afasta o aperto de mão, por elas estarem geladas. Impede a cerveja no bar, pois na mesa está um frio de rachar.

O verão carrega consigo a beleza de um sorriso, a malícia de um bronzeado, o fogo de uma paixão. O inverno nos traz apenas o desejo ilusório de hibernar.

10 de jun. de 2011

Historinha de cidade grande

Gabriel Oro
@orofeelings

-Passa o celular.

-O quê?

-Tu me ouviu cara, passa o celular!

-Eu não tenho celular.

-Claro que tem, eu te vi olhando a hora agora pouco.

-O quê? Ah, você quer dizer o meu... relógio. De bolso. Touchscreen.

-É o quê?

-Ah, você não conhece? Sério? É um relógio de bolso, tipo aqueles dos filmes antigos e tal, sabe. Só que é touch screen, por isso o seu engano, ele lembra mesmo um celular, agora tenho que ir.

-Nem vem que eu sei que era um celular...

-Quem me dera, quem tem dinheiro pra gastar com esses celulares chiques de hoje em dia, com a inflação e tudo aquilo...

-Porra cara, tu acha que eu sou burro?

-Posso responder isso outra hora? Tipo... quando você estiver sem a arma?

-Ok ok, já estou cansado disso!

-VOCÊ está cansado? E eu que estou há 20 minutos atrás de um maldito táxi!

-Chega!

-Mora onde?

-Zona su... peraí, não...

-Eu também, quer rachar a corrida?

-Se eu quero... cara, chega. Me dá o celular logo e me deixa ir embora de uma vez...

-Mas eu não..

-Claro que você tem celular! Todo mundo tem celular! Eu te vi olhando as horas 10 minutos atrás!

-Acho que não foram nem 5 minutos...

-Bom, pareceu muito mais pra mim...

-O que você quer dizer com isso?

-Nada, nada...

-Senti um tom sarcástico!

-Não, imagi... espera um pouco, não! Pela última vez, celular!

-Está bem, está bem.

-Há! Então admite que tem?

-Sim, tenho.

-Me dá!

-9976 8948.

-...

-...

-Me dá sua carteira.

-Minha o quê?


8 de jun. de 2011

Escreve. Foge.

Ramiro Simch
@miroez

Esbarra. Encara, desvia. Pisa na formiga. Tropeça. Encontra, conversa. Constrange. Pede licença, continua. Olha a bunda, passa a mão. Foge. Avista, corre. Escorrega. Segue. Atravessa. Deixa cair. Agacha, pega. Sua. Tromba. Xinga. Foge. Sinaliza. Alcança. Sobe. Foge.




6 de jun. de 2011

Poltrona 19

@pv_lopes


Durante a vida desenvolvemos várias teses. Vamos além disso, passamos a dedicar mais fidelidade a elas do que ao próprio clube de futebol.
Podemos buscar o entendimento para isso a partir do funcionamento cerebral. O hemisfério esquerdo, responsável pela linguagem, é o que dá sentido à realidade, mesmo quando não há sentido algum. Isso pode servir de fundamento para criar possibilidades sobre determinado acontecimento, seja ele futuro ou passado. 

Contudo, não adiantaria criarmos essas versões se não servisse para convencer os outros daquilo que acreditamos.
Aí está, a tese. Fundamentamos, inserimos vários exemplos para dar credibilidade a ela. Algumas vezes conseguimos.
Eu, por exemplo, tenho algumas. Uma delas é de que  a poltrona mais segura de um ônibus é a de número 19. Ela fica estrategicamente posicionada do lado direito, ao centro do ônibus. Em uma batida frontal, tu estarias "distante" do choque. Em uma batida traseira, tu estarias à mesma distância. Uma batida lateral, praticamente impossível.

Esta é uma tese. Espero que acreditem. Caso isso não aconteça, lembre que é porque o teu cérebro está tentando dar sentido onde não há.

4 de jun. de 2011

Guichê nº1

Ariel Engster
@ensta


Quando eu morava em São Leopoldo, ia quase toda semana pôr alguma carta no correio. Não que eu tivesse tanta coisa pra falar, nem tanta gente pra quem escrever. O que me motivava estava atrás do guichê nº1, o único em que eu ia, mesmo que os outros estivessem vazios. O motivo era Letícia.
Não queria admitir, mas ela era loira. Vai parecer que só há espaço para loiras em minha vida, o que não é verdade. Em todos os casos, Letícia era. Aliás, Leka. Era o apelido dela. Pelo menos eu imagino que era, já que estava escrito com corretivo sobre o perfurador dela, com uma estrelinha sobre o “e”. Belo por demais.
Um dia resolvi escrever para ela. Uma atitude louca, totalmente reprovável. Naqueles dias, entretanto, pensar não era algo que eu fizesse muito. Peguei a caneta, peguei o papel e pus-me no trabalho.

No dia seguinte, fui até a agência. Entrei e a vi, tão formosa, no guichê nº1. Toda de azul, com seu antebraço à mostra (eu era apaixonado pelo antebraço dela). Comecei a tremer de nervosismo.
Andei poucos passos até chegar à sua frente. Não havia fila. Curiosamente, não havia ninguém mais na agência – nem no guichê nº2, que sempre era ocupado por uma velha ranzinza que, aparentemente, não gostava de minhas visitas. Enfim, estávamos sós. Perfeitamente sós.
Pus a carta sobre o guichê. Ela olhou para a carta, olhou para mim. Sorriu e disse:
“Pra quem a carta, dessa vez?”
“Pra ti.”

Ela paralisou-se. Desfez o sorriso e olhou pra mim, meio envergonhada, meio perdida.
“E diz o quê?”, perguntou.
“Diz o que me fez vir tanto aqui. Por que tantas cartas. Por que sempre neste teu guichê. Explica como tu me ajudou a não enlouquecer e de onde veio a coragem de escrever. Escrever pra ti, especialmente.”
Virei e fui embora. Naquele fim-de-semana, fui morar em outra cidade. Nunca mais passei naquela agência. Afinal, odeio filmes de romance água-com-açúcar. Beijo do mocinho e da mocinha no final, nem pensar.

2 de jun. de 2011

TELA QUENTE

Ramiro Simch
@miroez

AE MEU TE LIGA SÓ

Mandou três screens de webcam no MSN em jpg. Dois tinham a mina que ele curte mostrando os peitos, e um era dela rindo.
Pra começar, que cara estranho. Ele ama a mina secretamente faz um ano e meio e me conta tudo que sente por ela. Quando ela descobre que ele existe e mostra os dotes, o cara me manda os jpgs??? Que tipo de pessoa quer que o melhor amigo se masturbe olhando pra mulher dele - pior ainda, pra mulher que nem é dele ainda?

SÓ NAO MELA A CUECA COM ESSES PEITO

O foda é que isso nem é o mais tosco nessa história. Eu peguei ela ontem. Essa mina mesmo. A guria que o meu melhor amigo idolatra. Nem eu to acreditando, baita gostosa. Não foi por querer na real. Já tava meio bêbado quando ela apareceu. Vazei da mesa de sinuca – jogo porra nenhuma – e ela veio trocar ideia. Quando me liguei já tava saindo do beijo (tipo quando tu tá no bus tentando não dormir, e no instante seguinte tu já tá acordando da soneca, tá ligado?).

AH MEO EU AMO ESSA MINA DEMAIS

Porra, agora a situação tá complexa que nem o Oriente Médio. Minha cabeça vai anotando em tempo real as conclusões, que de conclusivas não têm nada.
1 – A mina ficou com um cara num dia e no seguinte mostrou as tetas pro melhor amigo dele. Vagabunda.
2 – Meu brother é apaixonado por essa pessoa. Ele tem que saber que ela é uma puta e largar fora.
3 – Eu sou um pau no cu. Fiquei com o amor do meu camarada. Era pra eu estar mal, mas tava até meio satisfeito por ter pegado uma cremosinha. Agora diminuiu porque ela é uma cadela que deve ficar com qualquer um. Isso me torna assustadoramente pau no cu.
4 - Ele tem que saber que foi comigo que ela ficou ontem. Tem mesmo? Não vai mudar nada. Eu continuo me preocupando com ele, ele é meu mano, e ela segue sendo vagaba. O cara tem que saber que ela é uma vadia, mas eu não preciso ser um dos personagens da saga. Isso me torna terrivelmente pau no cu?

A GENTE VAI NO CINEMA AMANHA, VO DALE

Certo que se eu conto da promiscuidade dela e omito minha participação, ele vai falar com a mina, que vai contar a verdade. Isso seria o comum. Ela podia não estar nem aí e ficar de boa, mas sairia tranquilo demais pra mim. Se até minha ida à fruteira dá merda, um triângulo amoroso fugaz não vai dar?
Deixo ele curtir o love até descobrir a índole da guria e sofrer? Ou falo tudo agora, provo minha (des)lealdade e mato no peito as consequências?

POW ELA DISSE QUE QUER CONVERSA COMIGO SERIO

Hmm. Desliguei a TV. Assistir drama agora é difícil, não tem como se eu já tô em um.